Por Marcos Hirai

Nos últimos meses pós-pandemia, muito se falou e noticiou sobre cases focando sobretudo a realidade dos grandes varejistas – aqueles de maior porte e com grande capilaridade de lojas que, de alguma forma, estão conseguindo se reinventar, mantendo e diversificando seus negócios cada vez mais dentro da omnicanalidade.

Apesar das dificuldades geradas pela quarentena, estas empresas contam com pessoal capacitado, recursos financeiros e expertise para se manterem no jogo. Adicionalmente, podem captar recursos via IPOs, contam com linhas de créditos, recebem aportes de fundos de investimentos, têm disponibilidade de recursos remetidos pela matriz no exterior ou simplesmente contam com dinheiro em caixa.

Mas, desde o início do anúncio da quarentena, a realidade para a maioria dos micro e pequenos varejistas brasileiros tem sido muito dura e difícil. Fazendo uma pequena retrospectiva do que ocorreu desde março do ano passado, logo no início eles tiveram de, repentinamente, fechar as portas de suas lojas e precisaram tomar decisões importantes a fim de manterem a sobrevivência dos seus negócios – dentre elas, tiveram de cortar custos, renegociar contratos de trabalho com funcionários, com os clientes, com os bancos e com fornecedores. Adiaram planos e projetos e, naquele momento, ninguém imaginaria que as semanas seguintes seriam as mais desafiadoras para a manutenção de suas lojas.

Mas talvez o maior desafio tenha sido o processo de reinvenção dos seus negócios, que foram submetidos, diante das circunstâncias, às mudanças de comportamento do consumidor pós-pandemia. Como mudar do dia para a noite um modelo de negócios consagrado e que levou à continuidade até então? Para os pequenos, muitas vezes as decisões são solitárias e dependem sobretudo da figura do dono e dos seus sócios (quando houver), mas é fato que, na maioria das vezes, estes empresários carecem da falta de apoio, da falta de experiência e sobretudo de recursos e capital para tocarem mudanças de rumos nos seus negócios.

Para os donos de restaurantes, por exemplo, de uma hora para outra o delivery teve de substituir o atendimento presencial. Mas não se tratava apenas em associar-se a algum grande aplicativo especializado e pronto. Uma série de mudanças estruturais precisa ocorrer para iniciar entregas em domicílio. Muita coisa muda na operação: revisão ampla do cardápio, dos processos, das embalagens, do sistema, do comissionamento.

Muitos não estavam preparados e tiveram inúmeras dificuldades de se adaptar. Isto se deve ao fato de que, muitas vezes, o consumidor tem hábitos muito diferentes num ambiente de salão e dentro de casa. Vai desde o porcionamento dos produtos (por causa do consumo em família) à política de preços (ele fica disposto a pagar menos), passando por embalagens, cardápio, margens de lucro, etc.

Para entenderem melhor a crise neste setor, cerca de 12 mil bares e restaurantes fecharam as portas na cidade de São Paulo em 2020. Estima-se que, dos cerca de 1 milhão de estabelecimentos existentes no País antes da pandemia, 30% acabaram falindo, segundo dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).

Para os lojistas de produtos não essenciais, o e-commerce e as vendas por mídias sociais foram a saída possível para não pararem. Mas a imensa maioria não estava preparada para isso e teve de aprender a qualquer custo. Sobretudo os pequenos e médios, principalmente lojistas de bairro, eram os mais resistentes quanto à “digitalização do comércio” e em incorporá-las ao dia a dia dos negócios. Segundo pesquisa do Serviço de Apoio às Micros e Pequenas Empresas (Sebrae) realizada antes da pandemia, identificou-se que 18% dos donos de micro e pequenas empresas sequer acessavam a internet e 26% deles não utilizavam nem computadores (?!).

Ainda de acordo com esta pesquisa da instituição, 73% das micro e pequenas empresas não contavam sequer com páginas na internet e 60% delas não tinham perfil no Facebook. Para entenderem o tamanho do problema, segundo pesquisa da FecomercioSP, na capital paulista estima-se que 17 mil estabelecimentos varejistas fecharam as portas em 2020, a maioria de pequeno porte, com demissões chegando a 129 mil pessoas.

Mas houve alguns alentos no meio de tantas notícias ruins. A criatividade brasileira em momentos de crise pode ter sido a salvação para muitos pequenos varejistas que encontraram, no WhatsApp, a ferramenta mais eficiente para venderem seus produtos para seus principais clientes.

O aplicativo preferido dos brasileiros para a troca de mensagens instantâneas também se consolidou como ferramenta de promoção de vendas e de comercialização de produtos durante a pandemia. Nos meses de fechamento das lojas físicas, o recurso foi potencializado pelos lojistas para seguir o contato com os clientes, provocar compras e efetivar vendas e, no atual período de reabertura do varejo, tem se firmado como nova estratégia de negócios e de comunicação com os consumidores.

Outra ferramenta essencial encontrada pelos pequenos comerciantes foi a adesão aos marketplaces. O marketplace é como um shopping virtual, ou seja, um portal que abriga inúmeras lojas independentes para a venda de produtos e serviços variados.

Alguns marketplaces mais conhecidos são Magazine Luiza, OLX, Submarino, Amazon e Mercado Livre, entre outros. Ao venderem nestas grandes plataformas, eles tiveram acesso a um enorme público consumidor em potencial e isso significou vendas, muitas vendas. É importante ressaltar que o próprio mercado se movimentou para acolher esses pequenos negócios. Uma parceria entre o Sebrae e a gigante do varejo Magazine Luiza permitiu que inúmeros pequenos lojistas tivessem acesso à plataforma Parceiro Magalu, com vendas e apoio em marketing, logística de entrega, ferramentas de análise e gestão do e-commerce.

O panorama para 2021 ainda é de muita instabilidade para a economia brasileira e ainda pairam sérias dúvidas em relação ao comportamento do consumidor diante deste quadro. Para quem conseguiu até agora manter os seus negócios de pé, o ano de 2020 deixará legados. Para quem conseguiu fazer do limão uma limonada, este “chacoalhão” pode ter deixado a empresa mais forte e preparada para as novas demandas do mercado.

Marcos Hirai é CEO da Omnibox, startup especializada em varejo autônomo da Gouvêa Ecosystem

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