Por Marcos Hirai

Antes da pandemia, circular durante a semana em avenidas como a Engenheiro Luís Carlos Berrini, Paulista ou Faria Lima, na capital paulista, era conviver com multidões de pessoas, carros, bicicletas, motos e patinete, todos em ritmo frenético. E assim existia toda uma base instalada de lojas, bares, restaurantes, estacionamentos, academias e shopping centers no entorno destas localidades.

O cenário atual é desolador. Com grande parte das empresas ainda em home office, o que se vê são ruas e todo o comércio da região competindo para conquistar os parcos clientes. E assim está sendo em todas as grandes cidades do mundo que têm concentração de torres de escritórios.

Talvez o exemplo mais emblemático seja de Nova York. Conhecida como a capital do mundo e a cidade que nunca dorme, ela ainda mantém as regras de distanciamento social, apesar de já ter liberado a abertura da maioria dos estabelecimentos e escritórios. Porém, no mês passado, apenas 18% do 1,2 milhão de funcionários de escritórios da cidade havia retornado.

A ilha de Manhattan, outrora lotada de turistas e executivos, apresenta um ritmo atípico, sem engarrafamentos, e com calçadas vazias, estações de metrô bastante tranquilas, muitos restaurantes ainda fechados. A agitação noturna, sempre efervescente, está às moscas, assim como os teatros da Broadway (que ainda não reabriram). E, na esteira, o comércio sofre com a falta dos consumidores. Segundo o site Bloomberg, a pandemia já resultou em quase 6 mil fechamentos de negócios na cidade e no aumento de cerca de 40% dos pedidos de recuperação judicial.

Em São Paulo, o comércio ainda patina. Segundo pesquisa da FecomercioSP, na capital paulista estima-se que 17 mil estabelecimentos varejistas fechem as portas este ano, com demissões chegando a 129 mil pessoas. E o setor de restaurantes pode ser considerado um dos mais afetados, afinal, desde o começo da pandemia, cerca 12 mil bares e restaurantes fecharam as portas na cidade de São Paulo. Estima-se que, dos cerca de 1 milhão de estabelecimentos existentes no País antes da pandemia, 30% já fecharam as portas de vez, segundo dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).

Ninguém duvida de que o dinamismo e a energia voltarão a cidades como Nova York ou São Paulo. Mas essas metrópoles certamente mudarão sua dinâmica. A natureza do trabalho mudou. A urgência da pandemia tirou da inércia muitas empresas que resistiam ao home office. A expectativa é que de 30% a 40% dos funcionários que hoje estão em casa continuarão fazendo teletrabalho pós pandemia.

Lá fora, gigantes de tecnologia, como Google e Facebook e Twitter, já anunciaram estender o trabalho remoto até meados de julho de 2021, com a possibilidade de o adotarem de forma definitiva. No Brasil, a petroleira Petrobras anunciou regras bem flexíveis sobre o local de trabalho dos empregados. Os 28.500 funcionários administrativos em escritórios espalhados pelo Brasil poderão escolher se querem ou não o home office. Nubank e XP também anunciaram medidas semelhantes.

Prevalecendo essa lógica, a tendência é que famílias com filhos partam para os bairros mais afastados ou cidades do interior em busca de mais espaço, menor custo de moradia e maior qualidade de vida. Porém, esse êxodo poderá ser compensado pelos jovens profissionais, que podem privilegiar a ampla infraestrutura dos grandes centros e o acesso maior de lazer, entretenimento e network.

As horas perdidas durante o trajeto para o escritório viraram tempo extra para dedicar à família. E, consequentemente, isso muda o seu deslocamento pela cidade. O cafezinho após o almoço, agora, será feito num estabelecimento vizinho (ou feito em casa). Também não faz mais sentido comprar os mantimentos da semana naquele grande supermercado de rede que ficava no caminho do trabalho, nem ir ao shopping afastado do centro. O espaço vivencial diminuiu. Ao evitar pegar transporte público, ou mesmo carros por aplicativo, quem não precisou trabalhar fora e não tem veículo próprio viu suas opções de saída de casa reduzidas ao bairro em que mora.

Diante desta tendência, uma nova geografia precisa ser considerada. Ao elaborarem seus novos planos de expansão, a primeira dica é deixar de lado as estatísticas e os dados pré-pandemia. Ficaram todas defasadas. O bairro “bom” para expandir agora pode ser “regular” ou “ruim” e vice-versa.

Além disto, mais do que nunca um novo elemento precisa ser considerado – a concorrência digital. Não se trata mais em analisar qual concorrente está estabelecido no bairro. No caso das farmácias, lojas pet, supermercados e restaurantes, é fundamental analisar quais varejistas entregam pelos apps de delivery na localidade, incluindo os estabelecimentos físicos, mas também as dark kitchens e as dark stores. Sim, são agora grandes concorrentes.

Já para os demais segmentos, faz-se necessário ampliar o raio de alcance da análise, uma vez que antes a medida se dava pela distância física que um pedestre ou um carro percorria e até a loja/imóvel; agora, toda a web está a um clique de distância.

Grandes empresas do e-commerce, como Magalu e Americanas, já fazem entregas no mesmo dia para determinados itens. O serviço same day delivery, que já está bastante disseminado nos Estados Unidos, começa a ganhar força por aqui. Conseguem fazer isto por meio de lojas hub ou dark storesestrategicamente localizadas perto de grandes centros consumidores. Outro gigante, o Mercado Livre, já tem uma gama bastante grande de itens oferecidos pelo next day delivery por meio do serviço full, prometendo entregas em 24 horas, inclusive nos finais de semana.

Diante de tantas mudanças, um profissional da área de expansão hoje precisa, antes de tudo, ser um analista de dados. Se antes planejar a expansão de lojas físicas era uma tarefa imobiliária, agora a análise deve obrigatoriamente incluir estudos sobre os hábitos do omniconsumidor pós-pandemia. Saber onde e como este consumidor compra é fundamental para a assertividade da escolha e abertura da próxima filial da sua rede. Ou quem sabe, de uma dark store ou uma dark kitchen. Bem-vindo a Omniera!

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